A importância da Ouvidoria nos Municípios e sua parceria com a Ouvidoria do MPSP

O princípio da transparência na administração pública decorre do Estado Democrático de Direito, previsto na Constituição Federal, que afirma que “a República Federativa
do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito” e tem como um de seus fundamentos a
cidadania.
E somente existirá democracia se houver transparência na administração pública A Lei de Acesso a Informação (Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011) trouxe como diretriz a
observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção (art. 3º, inc. I).
Complementando o Acesso à Informação, a Lei nº 13.460, de 26 de junho de 2017 dispôs sobre “participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos serviços públicos
da administração pública” e determinou, v.g., que “com periodicidade mínima anual, cada Poder e esfera de Governo publicará quadro geral dos serviços públicos prestados, que
especificará os órgãos ou entidades responsáveis por sua realização e a autoridade administrativa a quem estão subordinados ou vinculados” (art. 3º) e que “os serviços públicos e o atendimento do usuário serão realizados de forma adequada, observados os princípios da regularidade, continuidade, efetividade, segurança, atualidade, generalidade, transparência e cortesia” (art. 4º).
A Lei nº 13.460, de 26 de junho de 2017 também assegurou aos usuários de serviços públicos o direito à adequada prestação dos referidos
serviços (art. 5º, caput).
Logo, para o cumprimento das referidas leis – de acesso à informação e de proteção e defesa dos usuários de serviços públicos -, necessário que o Município seja dotado de
um órgão independente, que possa receber, examinar e dar o encaminhamento de todas as manifestações enviadas pelos cidadãos Esse Órgão, à evidência, é a Ouvidoria, que deve ser incumbida de receber, examinar e encaminhar reclamações, críticas, apreciações,
comentários, elogios, pedidos de informação e sugestões dirigidas ao Município, além de informar o interessado sobre o resultado de sua manifestação.
Importante ressaltar que Ouvidoria eficiente é sinônimo de credibilidade, pois mostra aos cidadãos do Município que o Gestor se importa com a opinião deles e que busca a melhor prestação do serviço público.
E engana-se quem afirma que a instalação da Ouvidoria acarretaria um custo a mais para o Município, principalmente os de pequeno porte.
Na verdade, ela representa a efetivação do princípio constitucional da eficiência. Explico:
Imagine uma grande empresa com 30 profissionais em áreas diversas, com telefones individualizados, mas sem uma telefonista; a cada ligação errada para um desses profissionais obrigaria ele a parar o que estava fazendo para redirecionar essa ligação para o profissional certo, com evidente prejuízo para a produção. Já com a contratação de uma telefonista com a devida capacitação não haveria encaminhamento
de ligações equivocadas e nem prejuízo para a produção.
Assim, a contratação da telefonista não representa um aumento de custo, mas sim, de eficiência. Essa mesma situação ocorre com os Municípios que contam com órgãos e secretarias diversas, desconhecidos por grande parte da população. É o Ouvidor Municipal, independente e capacitado, que será responsável por receber, examinar e encaminhar as manifestações dos cidadãos, evitando a necessidade de se manter atendimento individual
em todos os órgãos e secretarias.
Importante notar que nos pequenos Municípios a Ouvidoria – instrumento de cidadania – acaba sendo o único canal de comunicação entre o cidadão e o governo, permitindo a
este reavaliar sua administração, inclusive com mudança de rota, se necessário, deixando, v.g., de reformar uma praça para construir uma creche ou um hospital.
E por ser o Ouvidor Municipal o representante do cidadão perante a Administração Pública , ele deve ser independente (não precisa de autorização superior para dar andamento à
manifestação apresentada), acessível (está sempre presente para atender o cidadão pessoalmente, por carta, por e-mail, por telefone, pela internet etc.), resolutivo (procura
analisar a manifestação com foco a dar uma solução ao cidadão), capacitado (conhecedor do funcionamento da administração pública municipal), imparcial e atento a tudo que ocorre na cidade, sempre com o objetivo de desburocratizar e melhorar a qualidade do serviço público prestado.
Aliás, o crescimento do número de demandas para o Ouvidor é proporcional ao aumento da burocracia imposta ao cidadão no Município.
Mas pode ocorrer que a manifestação do cidadão questionando, v.g., a prestação de um serviço público pelo Município, seja dirigida à Ouvidoria do Ministério Público de São
Paulo (MPSP). Neste caso, se tal Município não contar com Ouvidoria parceira, tal manifestação acabará sendo encaminhada ao Promotor de Justiça da comarca, para que
venha a tomar as providências necessárias.
Daí porque a Ouvidoria do Ministério Público de São Paulo propõe a todos os Municípios do Estado a celebração de parceria, com a formação de uma Rede de Ouvidorias, visando facilitar e agilizar a tramitação e resposta das manifestações, de forma a propiciar a participação popular no processo de otimização e aperfeiçoamento da gestão pública,
bem como na prática do controle social, consolidando, assim, o exercício da cidadania e a democracia deliberativa.
Além disso, o Ouvidor do Município poderá alertar o Prefeito para o caso de a missão, os valores e as diretrizes fixados anteriormente não estarem sendo cumpridos.
Importante observar que a independência da Ouvidoria Municipal não interfere na autonomia do Município porque, com exceção do investimento mínimo com saúde – art. 7º
da Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012 – e educação – CF, art. 212, caput – e o gasto máximo com pessoal – LRF, art. 19, inc. III -, a aplicação do orçamento
público é de responsabilidade exclusiva do chefe do Poder Executivo Municipal. Mas a experiência obtida com a Rede de Ouvidorias dos Municípios acabará fornecendo ao Alcaide um rol de Boas Práticas que, eventualmente, poderá ser aplicado na cidade.
Por fim, importante destacar a atuação da Associação Paulista dos Municípios (APM) na busca pela aproximação entre os Municípios Paulistas e o Ministério Público de São Paulo, com o objetivo de atender de forma imediata as questões envolvendo a Municipalidade e o
cidadão, de forma simples e direta, sem impor a este qualquer ônus desnecessário, sendo, portanto, parceira da Ouvidoria do MPSP.
Assim, a Ouvidoria do Ministério Público de São Paulo aguarda que todos os Municípios do Estado, por meio de parceria, venham a integrar essa Rede de Ouvidorias, com o objetivo de melhor atender os interesses da sociedade.
¹Cidadania é a permissão atribuída a um cidadão para exercer os seus direitos e garantias de natureza civil, política e social. Exercer a cidadania é garantir que todos esses direitos sejam colocados em prática através do povo de uma determinada região (extraído do site: www.educamaisbrasil.- com.br/enem/geografia/cidadania).


²Neste ponto se equipara ao ombudsman, que seria o órgão público encarregado de fiscalização do Poder (De Plácido e Silva, in Vocabulário Jurídico, 32ª edição, Editora Forense, p. 986). O Ouvidor é o representante do cidadão, o responsável por fazer a mediação entre este (cidadão) e o Poder Público


Gilberto Nonaka é Procurador de Justiça, Ouvidor do MPSP.