No Congresso de Inovação em Governo, o secretário de Estado da Saúde de São Paulo, Eleuses Paiva, defendeu a revisão do modelo de financiamento do SUS e criticou a queda da participação da União nos gastos com saúde — de 68% na década de 1990 para 39% atualmente.
Ele apontou que muitas prefeituras paulistas já comprometem entre 30% e 40% de seus orçamentos com a saúde, valor bem acima do piso constitucional. “É praticamente inviável continuar assim. O Governo Federal precisa reassumir seu papel como principal financiador da saúde pública brasileira”, afirmou.
Diante da sobrecarga enfrentada pelas administrações municipais e da lentidão nas mudanças federais, o Governo do Estado de São Paulo decidiu agir. Segundo Paiva, o governador Tarcísio de Freitas determinou, logo no início do mandato, a adoção de medidas emergenciais para ampliar a oferta de serviços e dar sustentabilidade às redes hospitalares, sobretudo as filantrópicas, que respondem por cerca de 80% do atendimento no interior do estado.
Um dos primeiros desafios enfrentados foi a reativação de mais de 8 mil leitos hospitalares desativados por falta de custeio. “O problema não é construir hospital. É manter o hospital funcionando. A cada 13 meses, o custo de operação de um hospital de alta complexidade é suficiente para construir outro igual”, explicou.
Para enfrentar esse desafio, o Estado criou a Tabela Paulista, um modelo complementar de remuneração que atualiza os valores pagos por procedimentos realizados pelas instituições de saúde, valores esses que, segundo o secretário, estão congelados há mais de 20 anos pela tabela federal do SUS.
Inicialmente direcionada às filantrópicas, a tabela foi ampliada neste mês para todos os hospitais municipais, garantindo mais recursos para que os municípios possam aumentar sua capacidade de atendimento sem comprometer ainda mais seus orçamentos. “Agora, o hospital poderá ampliar sua oferta sabendo que terá respaldo financeiro do Estado para isso”, disse Paiva.
O secretário municipal de Saúde, Luiz Carlos Zamarco, destacou os desafios de uma metrópole como São Paulo, que administra 1.056 unidades e emprega 120 mil profissionais.
Entre os principais avanços recentes, o secretário citou a expansão da rede de UPAs – que passou de três para 34 unidades nos últimos anos, com novas inaugurações previstas – e o fortalecimento da atenção hospitalar, incluindo investimentos municipais até mesmo em áreas de alta complexidade, como oncologia.
A transformação digital foi outro marco da gestão. Durante a pandemia, a capital implantou a telemedicina, que continua em funcionamento e já permitiu zerar filas em especialidades como cardiologia, hematologia e psiquiatria. Hoje, mais de 4,5 milhões de usuários estão cadastrados na plataforma e-Saúde SP, que reúne serviços como acompanhamento de exames, busca de medicamentos e informações sobre vacinas.
O consultor da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) na área da saúde, Denílson Magalhães, reforçou que a atenção primária é a mais prejudicada pelo subfinanciamento, citando que a União repassa R$ 1,5 milhão por ano para manter as UPAs que custam, em média, R$ 12 milhões.
Ele reiterou o compromisso da CNM em apoiar os gestores locais com estudos, orientações e a plataforma Observe Políticas Públicas, que reúne análises sobre o financiamento e a execução de programas de saúde. “Estamos à disposição dos municípios para ajudar nessa reflexão. É preciso avaliar os custos, os riscos e a sustentabilidade de cada adesão a políticas federais”, frisou.
O ex-secretário municipal de Saúde e atual diretor executivo da TopMed Saúde Digital, Cleones Hostins, destacou a importância da inovação tecnológica como instrumento para ampliar o acesso e dar mais sustentabilidade ao sistema público de saúde.
Segundo ele, os municípios precisam aproveitar o momento pós-pandemia, em que o debate sobre telemedicina e saúde digital ganhou força, para pensar a eficiência dos gastos e estruturar sistemas mais inteligentes. “Até 2030, teremos 65% da população nativa digital. O que estamos fazendo hoje para transformar nossos municípios em cidades inteligentes de verdade?”, questionou.
Hostins lembrou que, ao contrário do que muitos pensam, não existe uma “receita única” para a saúde pública. Cada território possui uma rede e uma demanda próprias, o que exige projetos adaptados à realidade local. “Não dá para copiar o modelo de São Paulo e aplicar em um município de 20 mil habitantes. A tecnologia, porém, permite essa conexão ponto a ponto, otimizando o atendimento, ampliando a resolutividade e garantindo acolhimento ao cidadão que não consegue chegar presencialmente a uma unidade de saúde”, explicou.